fbpx

Neil Druckmann é um gênio do mal? The Last of Us oito anos depois

Share on facebook
Share on twitter
Share on whatsapp
Neil Druckmann dirigiu uma obra que ganhou uma porrada de GOTYs. Duas vezes.

SPOILERS ADIANTE DOS PRIMEIROS MINUTOS. O jogo tem 8 anos, se preocupar com spoiler a essa altura é culpa sua, mas não custa nada avisar.

O foco desse review é no primeiro, obviamente. Mas vamos deixar claro que, se você está procurando o review de um dos jogos mais premiados da face da terra, vai ser bem difícil chegar aqui antes de qualquer site que esteja montado em milhares ou milhões de visualizações sobre o assunto.

neil druckmann

Vou jogar o segundo pra fazer o review, mas acreditei que só faria justiça mesmo jogando os dois. Também não pretendo fazer um review tradicional, mas sim tentar analisar a técnica por trás do trabalho de direção de Neil Druckmann.

Sobre o segundo jogo em particular, eu já sei de praticamente todos os spoilers chave e quem vive e quem morre. Também acompanhei de perto o absoluto festival de horrores que partiu tanto de quem defendia quanto de quem acusava The Last of Us Part II. E aí é que está:

O 1 tem absolutamente as mesmas coisas que o 2.

Tudo que o povo reclamou abertamente sobre The Last of Us Part II está no 1. O progressismo, as causas sociais, tá tudo lá.

E agora batendo no título desse artigo: bicho, o Neil Druckmann é um gênio por ter feito isso. Ou melhor: ter feito isso numa obra que hoje tem oito anos de idade que teve tudo menos pouca notoriedade e o povo jamais ter focado nesse detalhe.

The Last of Us 1 é uma obra que não é tão clara nos aspectos que foca, mas que de fato foca em vários aspectos.

Neil druckmann the last of us

Beleza. Ficou vago? Então calma que vou desvagar:

Ao longo da obra inteira, Druckmann trabalha temas de progressismo de uma forma que tem zero interrupção na narrativa ou na estrutura da história contada. Ou, como é um argumento usado por muita gente: “não tem problema se não atrapalhar a história em si pra ficar forçando”.

A Ellie é lésbica? Sim. O Bill é gay? Sim. O mais bonito da história é justamente o fato de que absolutamente nada disso é evidenciado. Existem milhões de dicas pra ficar implícito – no caso do Bill – mas a Ellie até então é uma criança e tem zero envolvimento do tipo com o Joel.

Que fique absolutamente claro que nada que eu vou citar aqui, isoladamente, significa alguma coisa. E nem o conjunto completo – ainda que com uma profunda inspiração progressista – atrapalha mesmo que marginalmente a história que está sendo contada.

E que história!

Desde o primeiro momento, quando ainda nem é ele que a gente controla, Joel é apresentado como um homem claro e objetivo. Tá se rebentando pra criar a filha aparentemente sozinho, mas o breve vislumbre que a gente tem da vida dele não só é curta, mas como é através dos olhos dela.

Aliás, que montagem de momentos iniciais sensacional. Aqui que Neil Druckmann mostra a que veio. Deve ter algum nome pra esse troço mas eu tenho zero interesse em procurar no Google pra fingir que eu já sabia. A migração entre as sensações que o jogo quer passar na apresentação é absurda. Pouquíssimo foco em tutorial, apenas a interação básica pra quem nunca pegou um controle na vida. As mudanças de tom são claras, e acontecem enquanto a Sarah anda pelo cenário da casa, depois de ter sido colocada na cama pelo Joel.

Quando ela acorda, não está mais a sensação de conforto entre um pai e uma filha brincando entre si, mas uma inquietação – não pelo fato de nós sabermos qual é a temática do jogo – mas porque é uma adolescente acordando sozinha dentro de casa.

Conforme ela zanza pelo quarto tem um cartão de aniversário dela pro pai, que detalha um pouco mais como ele não tem muito tempo pra ficar com ela por causa do trabalho. Assim que ela sai do quarto, uma explosão no que parece ser um bairro vizinho assusta, mas ainda é PoP – Problema de outra Pessoa. A inquietação aumenta, e conforme ela desce a escada, escuta um cachorro vizinho latindo incessantemente… Até o momento que o cão é repentinamente silenciado.

Assim, pra explicar melhor a coisa: Videogames têm uma necessidade tremenda de cativar nos momentos iniciais. Você de fato só joga o início de um jogo depois que compra, mas você só faz a propaganda gratuita pros seus amigos – e leitores – se tiver jogado o jogo e achado bom.

Grande parte dessa segunda responsabilidade está na construção dos momentos iniciais, e Druckmann não só acerta como é infalível em The Last of Us.

Depois de já ter sido apresentado a uma sensação de temor, o jogador se encontra com Joel, ensanguentado e com pressa. Sem tempo pra explicar, protege Sarah de um vizinho zumbi dando um tiro nele.

Beleza, é aquele clichê de que ninguém nunca ouviu falar de zumbi na vida? É. Mas o Joel, não só ali mas ao longo do resto da história, mostra que simplesmente parar pra tentar refletir sobre o que está acontecendo ou o porquê de estar acontecendo não é uma característica dele. Ele é objetivo de uma forma que é claramente fria. Recusa ajuda pra gente com criança na beira da estrada pra não correr risco de estarem infectados. Mata vizinho sem sequer parar pra remoer a atitude. A maior característica da sobrevivência do Joel ao longo da história é a adaptabilidade.

E isso antes da Ellie entrar em cena.

A históra da Ellie é bem estruturada e ela é uma personagem que tem um profundo laço verdadeiramente famíliar com o Joel. A transição de protagonismo dele pra ela seria sensacional se… Bom, essa é pro próximo review.

Mas continuando: como disse anteriormente, todos os elementos do progressismo no primeiro The Last of Us são positivos. A Ellie faz um comentário meio “crítica dos padrões da indústria de beleza” sobre uma modelo num cartaz aqui. A heroína favorita da Riley (DLC Left Behind) é mulher e negra. Todos os líderes dos Fireflies são mulheres. A essa altura já teve um camarada que comentou bastante sobre isso num vídeo de 2018, antes do lançamento do The Last of Us Part II, então se quiser mais aprofundamento do que eu estou dando na questão ideológica, ele já fez a parte dele tem bastante tempo.

Tempo. O timing dos acontecimentos ao longo da história é ideal. Realmente é difícil se emocionar com um jogo que já teve praticamente todo seu enredo trabalhado na internet, mas a evolução do relacionamento entre Ellie e Joel é algo assombroso. A história segue rumos bem conectados entre si, que trazem zero sensação de forçação de barra.

Cada seção da história do jogo – que são bem definidas e separadas – mostra evoluções diferentes e as formas como o relacionamento dos dois se aprofunda. Existe uma infinidade de detalhes que auxilia a narrativa.

Joel, burro velho de guerra, fica verdadeiramente enojado de entrar numa cidade de canibais e cruzar com corpos pendurados num açougue. Isso se reflete, em gameplay, num fato que não tem qualquer evidenciação por parte do jogo que é que o Joel não corre no meio dos cadáveres pendurados. Ele obrigatoriamente anda.

A mesclagem de elementos da narrativa com os eventos do gameplay é constante. Não são situações separadas onde você pula de uma cena de tiro pra cair numa cutscene.

O gameplay não é revolucionário, mas a mecânica de crafting é tremendamente bem utilizada. Você se pega sempre procurando por recursos para criar itens. Alguns itens usam os mesmos tipos de recursos.

Certamente houve bastante dificuldade para diversificar inimigos, porque humanos agem exatamente da mesma forma, independente das diferentes gangues que você enfrenta. Os “zumbis” são em 3 tipos: runners, clickers e bloaters. Runners, bem, correm. Clickers são imunes a ataques stealth enquanto você não tiver uma faca e Bloaters são a versão de armadura dos bichos: tiro pra porra ou molotovs bem colocados completam o serviço.

A interação entre os personagens é meio complicada porque você vai se pegar conversando com alguém no que seria um ponto sério da história ao mesmo tempo que fica fuçando as gavetas atrás de colecionável e item pra craft.

Cara, é muito difícil tentar juntar tudo que foi feito somente em um texto, mas é impressionante a qualidade narrativa da história. Desnecessário que eu diga pra jogar, porque embora muita coisa já seja sabida, é impressionante jogar prestando atenção na forma como o Druckmann executou tudo que ele fez de forma idêntica no The Last of Us Part II.

O maior divisor de águas foi justamente o vazamento das cenas do jogo. Não fosse esse fato, certamente The Last of Us Part II seria tão ovacionado de forma unânime quanto o primeiro, mas isso ainda é a impressão de quem não jogou, e somente absorveu os eventos através das cenas vazadas.

Veremos qual vai ser minha opinião daqui uns dias.

Mais do que recomendado. Jogão.