Review por Samuel R. Auras
Final da década de 90, início dos anos 2000. Linkin Park e Avril Lavigne estão com tudo, alguns se preocupavam com o bug do milênio, e o mundo vibrava na expectativa de Senhor dos Anéis no cinema. Um jovem garoto jogava videogame, principalmente Super Nintendo e Playstation, com seus amigos, e um jogo dominava as tardes de domingo como nenhum outro: Crash Team Racing. CTR para os íntimos, o clone de Mario Kart (sim, e não tem nada de errado em falar isso) era o meu jogo favorito. Aliás, meu e de meus amigos. Disputávamos pelos melhores tempos no modo Time Trial, e as corridas e batalhas no multiplayer para 4 jogadores eram sem fim. Vinte anos depois do lançamento de CTR, em 2019, o jogo continua como um dos melhores jogos de corrida de kart da história. E então, surge Nitro Fueled.
CTR Nitro Fueled é um remake de luxo do jogo original. Ele reúne absolutamente todo o conteúdo do primeiro jogo, e coloca o dobro de conteúdo a mais. Tudo o que deu a CTR o seu status na época está presente neste remake, inclusive os códigos secretos – qual foi a última vez que você liberou um personagem em um jogo usando um cheat code? Eu não me lembrava mais, até que Nitro Fueled chegou. O jogo é nostalgia pura, e a expectativa estava altíssima por todos os fãs do original.
Um breve resumo do CTR de PS1, de 1999, para quem não conhece. Crash Team Racing é um jogo de corrida de karts com personagens da série Crash Bandicoot, nos moldes de Mario Kart e Diddy Kong Racing. O mercado não tinha poucos clones de Mario Kart na época – jogos de corrida com personagens dos Muppets, de Toy Story, de Lego… As opções eram as mais variadas. Mas duas coisas destacaram Crash Team Racing do resto: a jogabilidade espetacular e a variedade de modos de jogo. CTR conta com uma mecânica de drift e turbo muito diferente do que é o comum até hoje em outros jogos do gênero, uma mecânica que recompensa a maestria sobre o jogo. Em CTR, a diferença entre um jogador iniciante, um jogador mediano, e um jogador realmente bom é claríssima, e é lindo ver o que CTR pode fazer nas mãos de alguém competente. Tudo isso acontecendo em vários modos de jogo que incluíam um modo Aventura, com direito a diferentes objetivos em cada pista, coletar colecionáveis, liberar novos personagens secretos, e até uma história servindo como pano de fundo pra toda a competição. CTR merece, sem dúvidas, uma nota 10 para o que podia ser feito na época.
Então chegamos em 2019. Crash Team Racing Nitro Fueled, desenvolvido pela Beenox e publicado pela Microsoft, é um excelente jogo ruim. Ou um péssimo jogo perfeito. Calma, explico.
Tudo que faz de CTR de 1999 um jogo nota 10 no Playstation 1 está aqui. As mecânicas, os personagens, as pistas, os modos de jogo, o modo aventura, o multiplayer local para até 4 jogadores. Tudo refeito em alta definição de modo espetacular – é inegável que CTR NF é um jogo visualmente LINDO. Infelizmente, ele roda a 30 fps, mesmo no PS4 Pro e no Xbox One X, mas sinceramente, isso não atrapalha. Em horas e horas de jogo, não sofri nenhuma queda de framerate, e a performance do jogo em geral foi excelente, com exceção dos tempos de carregamento, que são um tanto altos. A trilha sonora original está aqui também, e você pode optar por ouvir as músicas originais da versão do Playstation 1 ou os remakes das músicas da trilha de Nitro Fueled.
Além de todo o conteúdo do jogo original – o que, na minha opinião, já justificaria o preço de $40 ou R$180 – a Beenox foi além. Também estão presentes no jogo todas as pistas e todos os personagens do jogo de Playstation 2, Crash Nitro Kart, refeitas para que se encaixem nas mecânicas de CTR. No fim das contas, o jogo tem, no lançamento, 31 pistas e 26 personagens. As pistas são, em sua grande maioria, espetaculares, com visuais muito variados e design criativo e muito divertido – prefiro algumas pistas à outras, mas não existe absolutamente nenhuma pista entre as 31 disponíveis que eu não goste. Da noite chuvosa de Tiger Temple às nuvens de Hot Air Skyway, tem algo pra todos os gostos, desde pistas simples até mais complexas. Todos os personagens ainda ganham dezenas de opções visuais, e você pode escolher com qual kart quer correr, e modificar rodas, cores, pintura… Toda a customização e todo o conteúdo de um jogo de 2019 que você espera está aqui.
Aliás, se tem algo esperado em um jogo de corrida em 2019 é a possibilidade de corridas online. E, sim, elas estão presentes em CTR NF – você pode correr ou batalhar contra amigos ou contra outras pessoas usando o sistema de matchmaking do jogo.
Com tudo isso, somado a uma sensação de velocidade que não se encontra em nenhum outro jogo de corrida de kart, Crash Team Racing Nitro Fueled com certeza deveria ser um jogo nota 10 certo? CERTO? Bem, eu também estava achando isso durante as primeiras horas de jogo. Mas quanto mais eu jogava – e, acredite, eu joguei MUITO desde o lançamento há duas semanas, já tendo adquirido a platina há alguns dias – mais defeitos e problemas eu encontrava. Problemas amadores que não deveriam estar presentes num jogo deste tamanho.
Permita-me deixar algo bem claro. Se você for um jogador mais casual, que quer um jogo de corrida para jogar com os amigos ou com a família, em multiplayer local, ou para jogar sozinho no modo aventura ou no arcade local, CTR NF, na minha opinião, é um jogo nota 10. Os problemas do jogo começam a ficar mais escancarados quanto mais experiência com o jogo você tem. O jogo conta com um sistema de Moedas com as quais você compra personagens novos, e você adquire estas moedas exclusivamente através do próprio jogo – até agora, CTR NF não conta com microtransações, embora o jogo seja publicado pela Activision, o que não costuma ser um bom sinal neste sentido. Qualquer coisa que estivesse no Crash Team Racing original pode ser liberado normalmente através do modo aventura ou do modo arcade local, mas os personagens novos e a maioria das opções de customização devem ser comprados com estas moedas. E a velocidade de aquisição delas é bem lenta, principalmente se você jogar apenas offline – jogando online, você adquire uma quantidade bem maior.
As pistas, tanto de Crash Team Racing quanto do Crash Nitro Kart, estão refeitas em CTR Nitro Fueled. E, embora as do CTR original estejam aparentemente idênticas em design, existem várias diferenças. A física do jogo não é uma reprodução exata do que era o jogo original, e isso muda as interações do kart com a pista de maneiras negativas – pulos para alcançar atalhos são um tanto inconsistentes, certas partes de curvas em algumas pistas parecem grudar no kart, dificultando a jogabilidade, e o jogo conta com certos bugs bem irritantes neste sentido, como um que faz seu kart, às vezes, parar em pleno ar durante um pulo, como se batesse em uma parede invisível, o que acaba totalmente com a sua velocidade. Não é nada que aconteça toda hora, mas quando ocorre é bem frustrante, principalmente se ocorre na última volta de uma corrida ou um time trial disputado. Falando em bugs, um especificamente feio que ocorre na versão de PS4 pode corromper o seu arquivo, apagando todo o seu progresso do modo aventura e da liberação de personagens e itens cosméticos – a própria Activision já recomendou oficialmente que os jogadores façam um backup de vez em quando até que isso seja resolvido, mas depois de duas semanas o problema ainda está acontecendo.
O maior problema do jogo, porém, é também seu maior atrativo para a maioria das pessoas: o modo online. Como esperado de jogos desse estilo, cada corrida é um caos, com bombas, mísseis e escudos voando pra lá e pra cá. O problema é que, atualmente, os itens estão bem desbalanceados, e normalmente o jogador que, nos primeiros segundos de corrida, se distanciar um pouco do resto dos jogadores, conseguirá manter facilmente a liderança enquanto os outros jogadores se batem e se atrasam. A versão de CTR do famigerado casco azul de Mario Kart, uma bola de energia que persegue o primeiro colocado, viaja pelo mapa muito lentamente, e acerta qualquer jogador que esteja no caminho, o que acaba tendo um efeito contrário do esperado e mais ajuda do que atrapalha o primeiro colocado. Além destes problemas de balanceamento, o matchmaking do jogo não é tão bom, e comumente coloca iniciantes e veteranos juntos na mesma sala.
O pior, porém, está por trás dos panos. Tudo leva a crer que o jogo não conta com servidores dedicados, e o multiplayer online é feito usando um sistema P2P. Para quem não entende do assunto, um dos oito jogadores faz o papel de servidor para os outros sete, e isso traz inúmeros problemas. Lag, bugs visuais, desconexões constantes… Este sistema era muito usado em jogos antigos, da década passada, e hoje em dia está totalmente ultrapassado, principalmente para jogos rápidos como jogos de tiro ou de corrida. P2P ainda funciona bem para jogos de estratégia em turno, por exemplo, mas para um jogo de corrida com a velocidade de CTR NF, este sistema debilita muito o online do jogo. Minha experiência com o multiplayer online até agora, por mais que eu ame o jogo, foi igualmente diversão e frustração.
No fim das contas, Crash Team Racing Nitro Fueled é um jogo diferente para cada público. Se o seu objetivo é jogar ele offline, sozinho ou com amigos no multiplayer local, a minha opinião é que ele vale cada centavo. A quantidade de conteúdo neste jogo é espetacular, o modo aventura é sensacional, as mecânicas são aquele clássico “fácil de aprender, difícil de dominar”, e o jogo irá receber suporte por um longo tempo após o lançamento, com novos personagens, uma nova pista por mês, e novas opções de customização. Se você quiser, porém, entrar de modo mais sério no online, prepare-se para ver o que acontece quando uma equipe aparentemente sem experiência ou sem recursos suficientes pode fazer. São erros amadores nas engrenagens de como o jogo funciona que tornam ele uma experiência mais frustrante e tiram o brilho da mecânica espetacular de corrida que o jogo tem.
NOTA: 8,5
Crash Team Racing Nitro Fueled está disponível para PS4, Xbox One e Nintendo Switch. Este review foi feito baseado na versão de PS4, jogado num PS4 Pro.